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Sem verba para estudos sobre RNA, vencedora do Nobel foi colocada "na geladeira" pela faculdade no passado

Katalin Karikó, que venceu o prêmio Nobel deste ano, de 68 anos, descobriu, em 2005, como impedir o sistema imunológico de desencadear uma reação inflamatória contra o RNA mensageiro fabricado em laboratório. As pesquisas da bioquímica possibilitaram o desenvolvimento das vacinas contra a Covid-19, essenciais para o controle da epidemia. Mas, até chegar lá, não faltaram obstáculos.

Katalin Kariko na entrega dos prêmios Breakthrough, no  Academy Museum of Motion Pictures em Los Angeles, em 15 de abril de 2023.
Katalin Kariko na entrega dos prêmios Breakthrough, no Academy Museum of Motion Pictures em Los Angeles, em 15 de abril de 2023. Jordan Strauss/Invision/AP - Jordan Strauss
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A pesquisadora húngara, de 68 anos, tornou-se a 13ª mulher a receber a recompensa, que ela dividiu com o cientista americano Drew Weissman. Nascida na Hungria, Katalin Karikó desenvolveu suas pesquisas nos Estados Unidos. Mas, antes de receber todos os prêmios de sua carreira, ela passou por diversos percalços. Filha de uma família de poucos recursos, após concluir seus estudos ela precisou fugir da Hungria comunista, em 1985, com o marido e a filha de dois anos, Susan Francia, que se tornou campeã olímpica de remo pela equipe americana em 2008 e 2012.

Desde que Katalin Karikó chegou aos Estados Unidos, nos anos 1980, ela realizou suas pesquisas longe dos holofotes e nem sempre com todo o apoio necessário. No final de 2020, quando as primeiras vacinas contra a Covid-19 foram lançadas pela empresa Pfizer/BioNTech, que ela co-dirigiu até 2022, a vencedora do Nobel contou que tinha dificuldades de lidar com a notoriedade repentina depois de tantos anos de trabalho no anonimato. 

Sua história ilustra "a necessidade de apoiar a Ciência em diferentes níveis", disse, em uma entrevista dada em sua casa na Filadélfia em dezembro do de 2020 à AFP. Nos anos 1990, a pesquisadora passou a maior do tempo tentando obter financiamentos para suas pesquisas sobre o RNA mensageiro, moléculas que "ensinam" as células a produzir protéinas benéficas para nosso organismo.

Durante seus estudos, a pesquisadora apostou na hipótese que o RNA mensageiro poderia ter um papel fundamental em algumas doenças, como na reparação de tecidos cerebrais após um AVC, por exemplo. 

Mas a direção da universidade da Pensilvânia, onde a cientista estava se preparando para se tornar professora titular, decidiu interromper as suas pesquisas, diante da dificuldade de Katalin  em obter bolsas de estudo para financiar seus projetos. "Na época eu deveria ser promovida e, em vez de uma promoção, me rebaixaram de cargo, esperando que, desta forma, eu pediria demissão", lembra.

Na época, Katalin Karikó não tinha o green card, o visto de residência americano, e precisava trabalhar para renovar sua permissão para continuar nos Estados Unidos. Para ela, ganhar menos e continuar na universidade representava ainda um outro desafio: seria difícil pagar a faculdade para sua filha com um salário mais baixo. Mas, apesar das dificuldades, ela não abandonou seu projeto.

No final dos anos 1980, a comunidade científica estava centrada na compreensão do DNA e suas pesquisas chamavam pouca atenção. A cientista húngara, entretanto, continuou apostando no RNA, e na ideia de que seria possível fornecer às células meios para que elas mesmas fabricassem proteínas terapêuticas. 

Para ela, essa seria a solução que permitiria evitar a modificação do genoma, introduzindo modificações genéticas incontroláveis. Mas, o problema, é que o RNA provocava reações inflamatórias e era considerado como um "intruso" pelo nosso sistema de defesa.

Cadê seu supervisor?

Ela e o imunologista Drew Weissman, com quem dividiu o Nobel, conseguiram aos poucos introduzir ínfimas modificações na estrutura do RNA que possibilitaram controlar a rejeição pelo sistema imunológico.

A descoberta, em 2005, foi um marco na carreira de Katalin. Em seguida, a cientista e seu colega americano conseguiram o que é considerado um dos maiores desafios para os cientistas: conservar a molécula de RNA em nanopartículas de lipídios, evitando assim que elas se dispersassem rápido demais e fossem inutlizadas para uso terapêutico.

A pesquisa foi publicada em 2015 e foi essencial para o desenvolvimento das vacinas de RNA mensageiro contra a Covid-19, em 2020. A primeira foi comercializada pelo laboratório alemão Pfizer/BioNTech, do qual ela era vice-presidente na época.

Hoje, apesar de seus inúmeros prêmios científicos renomados, entre ele o Lasker e Breakthrough prize, Katalin Karikó nunca esqueceu dos momentos em que foi subestimada no mundo científico e muitas vezes sexista. Como quando, no fim de uma palestra, perguntaram para ela: "onde está seu supervisor?"

(Com informações da AFP)

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