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Europa não está preparada para enfrentar riscos climáticos e deve se adaptar a 'catástrofes', diz relatório

A Europa não está preparada para enfrentar o aumento rápido dos riscos climáticos, de acordo com um alerta lançado nesta segunda-feira (11) pela Agência Europeia pelo Meio Ambiente (AEMA na sigla em português), que publicou sua primeira avaliação sobre o tema. Segundo o documento, que identifica 36 riscos climáticos principais, oito pedem uma resposta urgente. Para climatologista entrevistado pela RFI, as políticas públicas devem se centrar mais em adaptação.

Os bombeiros combatem incêndio próximo de Saint-Magne, ao sul de Bordeaux, em 12 de agosto de 2023.
Os bombeiros combatem incêndio próximo de Saint-Magne, ao sul de Bordeaux, em 12 de agosto de 2023. AP
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A Europa poderá enfrentar situações “catastróficas” como ondas de calor, secas, incêndios e inundações, se não agir rapidamente sobre os riscos climáticos que enfrenta, muitos dos quais já chegaram a um nível crítico, alertou esta segunda-feira a AEMA.

“O calor extremo, a seca, os incêndios florestais e as inundações que temos vivido nos últimos anos na Europa irão piorar, inclusive em cenários otimistas de aquecimento global, e afetarão as condições de vida em todo o continente”, escreve a agência no comunicado que apresenta seu primeiro relatório sobre a avaliação dos riscos climáticos na Europa.

“Os eventos (climáticos extremos) representam o novo normal”, insistiu a diretora da AEMA, Leena Ylä-Mononen, durante uma coletiva de imprensa. “Eles também devem ser uma advertência”.

A Europa é o continente que aqueceu mais rapidamente nos últimos 40 anos, sublinhou a agência. Segundo François Gemenne, presidente do Conselho Científico da Fundação pela Natureza e o Homem e membro do IPCC (grupo de especialistas da ONU sobre a evolução do clima), isso acontece porque o aquecimento global não é um fenômeno uniforme, em algumas regiões o aumento das temperaturas é maior.

“Isso quer dizer que a Europa deve enfrentar riscos climáticos muitas vezes maiores do que outras regiões do mundo. Acontece que a Europa, como continente industrializado, por muito tempo acreditou que ela era, de certa maneira, imunizada contra os impactos das mudanças climáticas. Acreditava que era um problema dos países do Sul (global), para as gerações futuras. Agora vemos, de maneira um pouco brutal e com atraso, como somos vulneráveis”, diz.

Motorista em uma estrada inundada após chuvas fortes em Aigues-Vives, no departamento de Gard, no sul da França, em 14 de setembro de 2021.
Motorista em uma estrada inundada após chuvas fortes em Aigues-Vives, no departamento de Gard, no sul da França, em 14 de setembro de 2021. © AFP/Sylvain Thomas

Riscos imediatos e urgentes

O estudo enumera 36 grandes riscos climáticos para a Europa, 21 deles exigem uma ação imediata e oito uma resposta urgente.

Em primeiro lugar, estão os riscos ligados aos ecossistemas, principalmente marinhos e costeiros. Os efeitos combinados das ondas de calor no mar, da acidificação dos oceanos e do esgotamento do oxigênio e de outros fatores antropogênicos (gerados pelo homem como poluição, pesca, etc.), por exemplo, ameaçam o funcionamento dos ecossistemas marinhos, segundo o relatório.

“Isto pode levar a uma perda substancial de biodiversidade, incluindo eventos de mortalidade em massa”, acrescentou Leena Ylä-Monone.

Outro grande risco são as ondas de calor. Elas "prejudicam, ameaçam nossa saúde. Podem causar estragos nos ecossistemas. Na Europa, estão frequentemente associadas a secas e esta é uma combinação perigosa para as infraestruturas e o abastecimento de água", observou o especialista em riscos climáticos da agência, Hans-Martin Fussel.

Para a AEMA, a prioridade é que os governos e as populações europeias reconheçam de maneira unânime os riscos e concordem em “fazer mais e mais rapidamente”.

“Precisamos fazer mais, ter políticas mais fortes”, insistiu Ylä-Mononen. A agência, no entanto, reconheceu o “progresso considerável” alcançado “na compreensão dos riscos climáticos (...) e na preparação para esses riscos”.

O relatório mostra que a maioria dos riscos já recebeu alguma atenção, mas a “implementação de ações eficazes pode ter sido dificultada por elementos como prioridades concorrentes, responsabilidade pouco clara ou fundos de investimento insuficientes”, lamentou.

Para Gemenne, as políticas públicas aplicadas pela União Europeia e os países europeus se baseiam em previsões ultrapassadas. Além disso, dão pouca atenção à necessidade de adaptação.

“Quando falamos de luta contra as mudanças climáticas, falamos quase sempre somente de redução de emissões de gases do efeito estufa. O que diz o relatório é que é necessário também nos preparar para os impactos das mudanças climáticas ao mesmo tempo que se reduz as emissões”, diz. “Não se trata de escolher entre um e o outro, vamos ter que fazer os dois, evitar o que será incontrolável e administrar o que já está acontecendo”, frisa o pesquisador.

Gemenne também diz que está “preocupado o recuo que sofrem atualmente algumas políticas climáticas europeias, principalmente o Green Deal, o pacto verde”, fazendo referência às medidas tomadas pelo governo francês para deter a crise do setor da agricultura.

“Infelizmente, sabemos que este não é um tema eleitoralmente promissor porque, para muitos, parece uma coação, uma lista de coisas que não querem fazer, de custos adicionais a suportar, de sacrifícios a fazer, de renúncias a aceitar. Ainda não parece, para muitos, um verdadeiro projeto econômico democrático”, diz.

“O desafio que temos diante de nós, é transformar o que hoje parece uma coação em um projeto real que pode ser também eleitoralmente rentável. Mas, neste momento, este não é o caso e os governos estão bem cientes disso”, diz.

Moradores tentam apagar um incêndio em uma floresta na cidade de Gennadi, no sul da ilha de Rhodes, no sudeste da Grécia, em 25 de julho de 2023.
Moradores tentam apagar um incêndio em uma floresta na cidade de Gennadi, no sul da ilha de Rhodes, no sudeste da Grécia, em 25 de julho de 2023. AP - Petros Giannakouris

Toda a Europa sob ameaça

As zonas mais expostas situam-se no sul da Europa, ameaçadas por incêndios, escassez de água e seus efeitos na produção agrícola, impacto do calor no trabalho ao ar livre e na saúde, segundo a AEMA.

“As regiões costeiras baixas estão particularmente expostas a inundações, tempestades e riscos de inundação”, explicou também Füssel.

No entanto, o norte da Europa não é poupado, sublinhou a instituição, como evidenciado pelas recentes inundações na Alemanha ou pelos incêndios florestais na Suécia.

Na terça-feira, a Comissão Europeia deverá publicar o seu primeiro relatório sobre os riscos climáticos na UE.

Para Gimenne, Apesar da multiplicação de fenômenos climáticos extremos como incêndios, secas e falta de água potável, que agora são flagrantes em certas regiões, a população europeia tem dificuldade em entender que a ameaça já existe.

“A gente sempre pensa que vai se salvar da ameaça. É como o fumante inveterado que pensa que vai escapar do câncer de pulmão. Esperamos sempre cair no lado certo das estatísticas”, lamenta o pesquisador.

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