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Planeta Verde

Alta da destruição da Amazônia reflete “liquidação” ante o possível fim de governo Bolsonaro

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A destruição da Amazônia se acelera neste segundo semestre, com um mês de setembro que já tem as piores queimadas da floresta em 12 anos, conforme novos dados revelados pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Também a área ocupada ilegalmente pelo garimpo nunca foi tão grande, quase dobrando entre 2010 e 2021, apontou o Mapbiomas na semana passada.

Bombeiros e voluntários combatem um incêndio na floresta em Apuí, no sul do Amazonas, em 21 de setembro de 2022.
Bombeiros e voluntários combatem um incêndio na floresta em Apuí, no sul do Amazonas, em 21 de setembro de 2022. AFP - MICHAEL DANTAS
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Lúcia Müzell, da RFI

Esses e outros números refletem o que pode ser o apagar das luzes do governo que “passou a boiada” da regulamentação e fiscalização ambientais. Para ficar na analogia feita pelo ex-ministro do Meio Ambiente em plena pandemia, agora, a porteira pode estar prestes a se fechar – e os atores que protagonizam a ilegalidade nos biomas brasileiros aceleram para conquistar novas terras.

“A gente não via fogo em grandes quantidades na região de Lábrea, por exemplo, ou no sul do Amazonas. Não era um tema naquela região, e a gente está vendo um fogo que as pessoas nunca viram antes. Tem uma nova frente de desmatamento muito grande por ali, especialmente no entorno da estrada que liga Porto Velho a Manaus, a BR-319”, explica Tasso Azevedo, coordenador-geral do Mapbiomas, plataforma de referência no monitoramento de queimadas em tempo real. “Nesse ano, particularmente, como o desmatamento está crescente, tem bastante material combustível. Nesses lugares, a gente está vendo muito fogo.”

Recorde atrás de recorde

Os recordes de queimadas se sucedem a registros igualmente alarmantes de desmatamento em agosto – um processo é a sequência do outro, no ciclo da ocupação ilegal de terras da Amazônia. O sistema Deter do Inpe mostrou que, em um ano, a devastação aumentou 81%. No acumulado de janeiro a meados de setembro, os incêndios já superam o total registrado em 2021.

Em plena pandemia, ex-ministro Ricardo Salles conclamou gabinete de governo Bolsonaro a "ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas" ambientais.
Em plena pandemia, ex-ministro Ricardo Salles conclamou gabinete de governo Bolsonaro a "ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas" ambientais. AP - Eraldo Peres

O ambientalista João Paulo Capobianco, presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), lembra que, historicamente, o desmatamento tende a crescer em época eleitoral, em consequência ao relaxamento da atenção aos crimes ambientais no período.

“Os únicos anos em que isso não aconteceu foram nos anos de atuação reforçada do PPCDAM (Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia), em 2005, 2009 e 2013. Em geral, existe uma correlação, mas o que nós estamos vendo neste ano é uma explosão”, ressalta. “Há uma perspectiva de que não haverá punição, portanto ocorre uma espécie de liquidação, ou seja, os agentes grileiros, principalmente, correndo para tentar obter a maior área possível de grilagem.”

‘Revogaço’ à vista

Existe a expectativa de que a direção poderá mudar 180° em um eventual governo com Lula, que assumiu um conjunto de propostas de Marina Silva para a pauta ambiental. O candidato já antecipou a intenção de promover um “revogaço” de medidas do governo Bolsonaro, que deve incluir instruções normativas, decretos e portarias ambientais.

“Isso está levando a uma verdadeira correria por lá, uma espécie de Black Friday do desmatamento. É uma coisa inacreditável, mas infelizmente, nós estamos verificando isso mesmo”, salienta Capobianco.

Ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva se reaproximou de Lula nesta eleição e trouxe pacote de propostas para a pasta. (12.09.2022)
Ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva se reaproximou de Lula nesta eleição e trouxe pacote de propostas para a pasta. (12.09.2022) © Ricardo Stuckert

Anulação do cancelamento de multas ambientais, reforço do Ibama e o ICMBio, aceleração das verificações dos Cadastros Ambientais Rurais, embargo comercial das áreas suspeitas de desmatamento ilegal, desobstrução de áreas indígenas invadidas por garimpo e de exploração ilegal. O rol de medidas que podem estar na mira do revogaço é amplo.

“É um pouco o fim de festa. Se o presidente Bolsonaro for reeleito, temos a tranquilidade de que qualquer coisa que a gente faça agora não será penalizada. Mas se há uma alternância de poder, então é a nossa última chance de criar o fato consumado e depois contar com algum tipo de anistia que vai acontecer mais à frente", observa Azevedo.

Entretanto, em caso de mudança de presidente, o clima não vai mais ser tão favorável para a redução do desmatamento quanto foi nos primeiros anos do governo Lula, salienta Capobianco.

“Na época, houve um certo efeito surpresa, com uma ação muito incisiva e rápida do governo, integrada, com vários ministérios. Hoje, espera-se que haverá muita reação, por parte de lideranças que tiveram muitas vantagens nesses últimos três anos e vão querer mantê-las”, frisa o presidente do IDS, que coordenou a criação do PPCDAM em 2003. “Há também a questão da liberação do acesso a armas, que permitiu que as armas se espalhassem de forma descontrolada no Brasil inteiro e na Amazônia em particular. E a criminalidade, de forma geral, aumentou muito na Amazônia”, lamenta.

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