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Londres defende envio de refugiados para Ruanda, apesar de críticas à medida, considerada ilegal

A ministra britânica do Interior, Priti Patel, e o chefe de diplomacia de Ruanda, Vincent Biruta, publicaram no jornal Times desta segunda-feira (18) um texto conjunto defendendo uma contestada reforma migratória apresentada na semana passada pelas autoridades do Reino Unido. Londres propôs que os requerentes de asilo sejam enviados para Ruanda, o país africano seria remunerado em troca do acolhimento dos migrantes.

A ministra britânica do Interior, Priti Patel, ao lado do chefe de diplomacia de Ruanda, Vincent Biruta, durante a assinatura do acordo migratório.
A ministra britânica do Interior, Priti Patel, ao lado do chefe de diplomacia de Ruanda, Vincent Biruta, durante a assinatura do acordo migratório. AFP - SIMON WOHLFAHRT
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Na tribuna publicada no jornal britânico, Patel e Biruta afirmam que o sistema global de asilo não funciona mais, pressionado não apenas por crises humanitárias, mas também por “traficantes de pessoas que exploram o sistema atual em seu próprio benefício”. Para eles, o acordo assinado na quinta-feira (14) é uma solução “legal, segura, organizada e controlada para melhorar a vida das pessoas”, pois vai combater a questão da imigração ilegal “na raiz”.

Os dois ministros afirmam que o envio dos migrantes para Ruanda vai “perturbar o modelo econômico das gangues de crime organizado”. Eles insistem que o tráfico de migrante “não pode mais continuar” e que o projeto visa impedir a ação de criminosos que “exploram o sistema”, levando milhares de pessoas a correrem riscos importantes tentando atravessar o canal da Mancha.

Segundo o acordo, Ruanda receberá 120 milhões de libras (mais de R$ 720 milhões) "para acolher solicitantes de asilo e migrantes e dar-lhes um caminho legal para a residência". O texto não explica exatamente quais serão os critérios de seleção dos migrantes enviado aos país africano, a 7.000 km do Reino Unido.

“Pessoas trocadas como mercadorias”

O projeto suscitou críticas severas de ONGs e a "firme oposição" do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur). "As pessoas que fogem da guerra, de conflitos e da perseguição merecem compaixão e empatia. Não devem ser trocadas como se fossem mercadorias e transferidas ao exterior", disse, em um comunicado, Gillian Triggs, Alta Comissária Adjunta do Acnur para a Proteção Internacional.

No fim de semana os líderes da Igreja da Inglaterra também contestaram o acordo. O arcebispo de Canterbury, Justin Welby, o clérigo mais antigo da Igreja da Inglaterra, juntou-se aos críticos em sua mensagem de Páscoa. O líder religioso afirmou que a proposta levanta "sérias e graves questões éticas". O arcebispo disse que um país como o Reino Unido, formado com base em valores cristãos, não pode "terceirizar suas responsabilidades, mesmo para um país como Ruanda, que tem boas intenções".

Acordo é contrário à Convenção de Genebra

Além da questão ética, algumas ONGs alertaram para o possível caráter ilegal da medida, que visa aqueles que “cruzam fronteiras de forma irregular”. François Gemenne, pesquisador especialista em fluxos migratórios do Instituto de Ciências Políticas de Paris (Sciences Po), lembra que a Convenção de Genebra, da qual Londres é signatária, estipula claramente que as pessoas que atravessam uma fronteira para pedir asilo não podem ser consideradas ilegais, mesmo quando o fazem com a ajuda de intermediários.

“Quando se foge de um risco de morte em seu país, nem sempre é possível pedir um visto. É preciso ir rapidamente para outro país e pedir asilo, independentemente dos meios usados”, ressalta o especialista. “É como se os ucranianos que fogem da guerra nesse momento pudessem ser enviados para Ruanda [após entrarem no Reino Unido]”, compara.

“Na verdade, isso quer dizer que o Reino Unido decidiu conceder asilo apenas às pessoas que entraram legalmente no país, o que representa uma minoria ínfima, e que poderiam se tornar [oficialmente] refugiadas. Isso quer dizer que o Reino Unido sairia, de fato, da Convenção de Genebra”, insiste o pesquisador.  

Na tribuna do Times, o chanceler ruandês explica que seu país tem uma “forte tradição” de acolhimento de pessoas vulneráveis, apesar das denúncias recentes feitas pelas Nações Unidas sobre o desrespeito dos direitos humanos no país africano. O texto também afirma que a parceria poderia inspirar outros países.

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