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"Todos os opositores ao governo são perseguidos na Rússia", diz analista

"Todo povo, o povo russo em particular, reconhece a escória e traidores e pode cuspir isso como se fosse uma mosca na boca", disse Vladimir Putin, na quarta-feira (16). As palavras de Putin foram justificadas no dia seguinte por Dmitri Peskov, porta-voz do Kremlin, evocando uma "purificação" da Rússia diante do conflito na Ucrânia.

Repressão na Rússia: "Todos os oponentes da guerra na Ucrânia são alvo de perseguição".
Repressão na Rússia: "Todos os oponentes da guerra na Ucrânia são alvo de perseguição". AP - Dmitri Lovetsky
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Por Daniel Vallot, RFI

O discurso das autoridades torna-se cada vez mais violento contra os que se atrevem a desafiá-los, como explica Françoise Daucé, especialista em Rússia da EHESS (Escola de Altos Estudos de Ciências Sociais), em Paris.

Vladimir Putin fala de uma "quinta coluna", de "traidores" a soldo do Ocidente cujo objetivo seria "destruir" a Rússia. A quem se dirige esse discurso?

Françoise Daucé: Podemos pensar em todos aqueles que se manifestaram contra a guerra na Ucrânia, todos os cidadãos – e foram muitos – que assinaram petições para protestar contra o conflito. E depois, claro, há todos aqueles que já são alvos há muito tempo das autoridades russas e, em particular, todas as organizações classificadas como "agentes estrangeiros" desde 2012, e que provavelmente serão vítimas dessas ameaças de "limpeza" da sociedade.

A figura da oposição russa e ex-proprietário da Companhia Petrolífera Yukos Mikhail Khodorkovsky fala durante uma entrevista coletiva, 20 de agosto de 2021.
A figura da oposição russa e ex-proprietário da Companhia Petrolífera Yukos Mikhail Khodorkovsky fala durante uma entrevista coletiva, 20 de agosto de 2021. AP - Mindaugas Kulbis

Não haveria também o desejo de enviar uma mensagem aos oligarcas que não são leais a Putin?

Contra os oligarcas, as ameaças foram especialmente fortes no início do primeiro mandato de Vladimir Putin. Recordamos o caso de Mikhail Khodorkovsky, preso e encarcerado por quase dez anos. Ultimamente, ameaças têm pairado sobre outros grupos da sociedade, ativistas como Alexei Navalny e sua fundação anticorrupção, que foi declarada uma "organização extremista", em 2021. Mas é perfeitamente possível que no contexto da guerra, essas ameaças se traduzam em prisões em diferentes grupos da sociedade.

20 de fevereiro de 2021, foto de arquivo, o líder da oposição russa Alexei Navalny olha para fotógrafos que estão no Tribunal Distrital de Babuskinsky, em Moscou, Rússia.
20 de fevereiro de 2021, foto de arquivo, o líder da oposição russa Alexei Navalny olha para fotógrafos que estão no Tribunal Distrital de Babuskinsky, em Moscou, Rússia. AP - Alexander Zemlianichenko

Vladimir Putin quer forçar as pessoas a fugir da Rússia se elas não concordarem com ele ou quer lançar uma série de prisões e expurgos da sociedade?

Os dois movimentos são concomitantes. Por um lado, assistimos a um movimento muito importante de exílio dos militantes mais ameaçados na Rússia. E você vê muitos cidadãos russos tentando sair, conscientes dessa violência e da possibilidade de o Estado russo se voltar contra eles. Esse é um primeiro movimento que o governo permite: ver seus adversários irem para o exterior também é uma forma de mantê-los afastados e se livrar deles. A segunda ação paralela é a repressão contra as pessoas que não podem sair ou que optam por ficar para continuar tentando mudar a situação por dentro. Para essas pessoas, de fato, a ameaça é muito preocupante e pode ser muito violenta. Especialmente desde que a Rússia deixou o Conselho da Europa e está se libertando cada vez mais das regras do direito europeu e internacional.

Houve uma época em que se falava nas fileiras da oposição, mesmo antes da guerra, de um retorno a 1937, ou seja, aos expurgos stalinistas. Mas muitos diziam na época que não podíamos fazer essa comparação. Estamos hoje no processo de mudar para algo que está começando a se parecer com isso?

Temos a sensação, com o início da guerra, de presenciar um ponto de desvio para cada vez mais violência dentro do país contra a própria população russa. Ainda não estamos nos expurgos stalinistas da década de 1930, no Grande Terror. Mas é isso que sugere a violência do discurso de Vladimir Putin. Podemos pensar, também, em todas as repressões que podem ocorrer em um contexto de guerra contra aqueles que são considerados a "quinta coluna", termo usado por Vladimir Putin para designar os "traidores", ou seja, todos aqueles que não são unidos, leais à causa do governo. Portanto, é provavelmente a reminiscência das horas mais sombrias do período soviético e a mobilização de ferramentas de repressão específicas para tempos de guerra.

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