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O Mundo Agora

Populações urbanas conectadas no Irã, Turquia e Argélia contêm regimes autoritários

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O século XXI será o das grandes cidades. Em várias regiões do planeta, ainda existem imensos contingentes de pequenos agricultores e cidadezinhas isoladas. Mas hoje, quase todas as pessoas – por mais pobres que sejam – tem acesso aos telefones celulares e aos programas de televisão. Populações inteiras podem ver e tomar consciência de outras realidades no seus próprios países e pelo mundo afora.

Manifestantes voltam às ruas para pressionar as demandas por mudanças democráticas generalizadas bem além da renúncia do ex-presidente Abdelaziz Bouteflika, em Argel, Argélia, 19 de abril de 2019.
Manifestantes voltam às ruas para pressionar as demandas por mudanças democráticas generalizadas bem além da renúncia do ex-presidente Abdelaziz Bouteflika, em Argel, Argélia, 19 de abril de 2019. REUTERS/Ramzi Boudina
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A vida no campo é dura, pobre, sem conforto, com pouquíssimas possibilidades de mudar a situação. E os jovens descobrem que nos países ricos e até nas suas próprias capitais nacionais, as oportunidades são bem melhores. Nas cidades é possível driblar o controle permanente da família e dos vizinhos, e tentar inventar uma vida nova, mais livre, aberta a todas as novidades e às expressões culturais, mesmo vivendo na pobreza. Imigrar virou o sonho de boa parte da juventude mundial. Como se a velha humanidade sedentária estivesse se tornando nômade.

Essa urbanização do mundo não é uma boa notícia para os líderes e regimes autoritários e populistas. As grandes cidades são caldeirões de cidadãos mais liberais, abertos, informados, conectados e abastados. Populações que clamam por democracia, estado de direito, liberdades individuais e coletivas. Graças às novas tecnologias da informação, a capacidade de mobilização contra decisões repressivas ou opressivas é quase instantânea.

O morador “urbano” quer serviços públicos de qualidade, junto com a liberdade de ir e vir, pensar e empreender. Nada disso é compatível com os novos populistas que querem fechar seus países e controlar a justiça e os fluxos de informação. Governos xenófobos que pretendem construir uma jaula de concidadãos sedentários, submetidos a uma propaganda permanente e a uma gestão oligárquica e corrupta do estado. Não é por acaso que os regimes autoritários – ou “iliberais” com se diz hoje – cortam a internet e os celulares do país cada vez que aparece uma rebelião.

Cidades estão reagindo

Hoje, as diversas formas de populismo tiram sua força dos territórios rurais ou menos urbanizados. Cidadãos parados no tempo, muitas vezes descuidados pelos poderes públicos e   apavorados com as mudanças econômicas e sociais do novo século. Pessoas que acabam caindo no conto da carochinha de que é possível voltar atrás para um mundo ideal onde não acontecia quase nada novo. Só que o tiro está saindo pela culatra.

As cidades em pleno crescimento estão reagindo. Istambul foi a primeira metrópole turca a votar contra o regime nacionalista e autoritário do presidente Erdogan. No Irã, dezenas de milhares de cidadãos se revoltaram contra a política repressiva dos aiatolás. E só foram silenciadas depois de um terrível massacre às escuras, com todas as comunicações cortadas, dentro e para fora do país. Na Índia, são centenas de milhares de pessoas em mais de cinquenta cidades que estão nas ruas, enfrentando a repressão contra a tentativa do governo de transformar o país num parque para hindus majoritários onde os indianos de fé muçulmana seriam cidadãos de segunda classe.

No Líbano, foi a juventude de Beirute e Trípoli que manifesta contra o regime fechado de equilíbrio entre representantes religiosos, e clama por um Estado laico e aberto. Na Argélia, são as grandes cidades em peso que pedem nas ruas, há quase um ano, o fim do regime militar. E nos Estados Unidos são as grandes metrópoles do Leste e do Oeste que organizam a resistência à política de Donald Trump.

A novidade hoje é que as cidades estão começando a se conectar. Os prefeitos de Budapest, Bratislava, Praga e Varsóvia assinaram um ”Pacto das Cidades Livres” para defender os valores da democracia e liberdade contra seus governos respectivos. Cada vez mais as centros urbanos estão se organizando e se comunicando a nível transnacional. É a revolta dos nômades cada dia mais numerosos contra os sedentários em declínio. Não há nada mais perigoso e mortal para o populismo autoritário.

Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos de Paris, faz uma crônica de política internacional às segundas-feiras para a RFI
 

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