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O Mundo Agora

Petróleo: quem ganha e quem perde com queda de consumo e preço?

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O cardeal de Richelieu, que dominou a política europeia no século XVII, sabia das coisas quando dizia que o “dinheiro é o nervo da guerra e a graxa da paz”. Hoje, mais de três séculos depois, podemos aplicar essa velha sabedoria ao petróleo. Preços altos demais é crise. Mas preços baixos demais, também. O problema é que a indústria petrolífera é supercomplexa e custa rios de dinheiro. Além de influenciar de maneira brutal a geopolítica planetária. Não é de se espantar que os preços vivem na gangorra e que petróleo é sempre drama

Navio-plataforma P 63 deixando o estaleiro Rio Grande, no Rio Grande do Sul.
Navio-plataforma P 63 deixando o estaleiro Rio Grande, no Rio Grande do Sul. Flickr: Programa de Aceleração do Crescimento
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E pelo visto, estamos entrando em outro período dramático.

Nos últimos meses os preços do barril degringolaram de US$115 para perto de US$ 80. Claro, não é a primeira vez que acontecem flutuações deste calibre. Em geral, depois de subir ou descer repentinamente, os preços voltam para um patamar relativamente estável. O grande regulador são os produtores do Golfo árabo-pérsico – sobretudo a Arábia Saudita – que detêm quase um terço da produção mundial. Basta os sauditas fecharem ou abrirem algumas torneiras para que o mercado acabe se ajeitando. Só que este imenso poder está sendo desafiado por duas novas realidades: a explosão da produção de gás e petróleo de xisto nos Estados Unidos e o fraco desempenho das economias emergentes.

O aumento da produção americana de hidrocarbonetos é espetacular. A tal ponto que os Estados Unidos estão se tornando o maior produtor mundial – e ainda por cima com preços bastante baixos. Hoje, boa parte dos poços cobre os custos do investimento com um barril abaixo de US$70 e, às vezes, muito menos. Acima é só lucro. Os americanos eram os principais importadores do planeta, mas hoje a compra de petróleo no exterior passou de 60% a 30% do consumo interno. E vai baixar mais. Quanto às economias emergentes, que nas duas últimas décadas foram a principal fonte de crescimento do consumo de energia, elas estão freando e algumas quase parando. Resultado: menos importações e uma verdadeira superprodução de petróleo no mundo. Sobretudo que nesse últimos anos de preços altos, vários países não-membros da OPEP investiram no setor, sobretudo no Atlântico (Angola, Gana, Brasil, Canadá), com produções que já estão ameaçando o papel de fiel da balança dos Estados do Golfo.

Na verdade, quando os preços começam a cair rapidamente, cada um tenta proteger a própria fatia de mercado abaixando os seus preços. Há muito tempo que a própria OPEP não respeita a disciplina do grupo quando decide que cada membro tem que reduzir a própria produção. Se não fosse o poder de fogo da produção saudita, que impõe uma certa moderação dentro bloco, este já teria explodido várias vezes.
Mas a nova realidade parece que veio para ficar. Antigos produtores, como a Líbia e o Iraque, que estavam fora do mercado por motivos geopolíticos, estão rapidamente aumentando as suas exportações. Uma possível volta do petróleo iraniano, se houver um acordo sobre o programa nuclear de Teerã, também vai acrescentar uma massa de hidrocarbonetos ao mercado. Não há dúvida, o petróleo por enquanto está jorrando a toda e o consumo mundial está em queda. E os preços vão caindo.

Quem ganha e quem perde com isso? Obviamente os maiores ganhadores são os Estados Unidos, cuja produção vinda do xisto já é um dos principais fatores do novo crescimento da economia americana. Mas também ganham grandes países consumidores como o Japão, que importa quase 100% de sua energia, a Europa muito dependente das importações, e a China, também outro grande consumidor. Quem perde são os países que dependem das exportações: o Golfo, a Venezuela, os países africanos do Atlântico e, sobretudo, a Rússia, cujo orçamento depende praticamente de um barril a US$100. Putin está ameaçado de ir à falência. Quanto ao Brasil, o problema é que a exploração do pre-sal custa uma baba. Com preços mundiais fracos demais, nossa produção pode não ser mais economicamente viável. Claro, qualquer choque geopolítico importante pode mudar a equação, mas por enquanto não há falta de petróleo no horizonte.
 

* Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos de Paris, assina esta coluna semanal para a RFI Brasil

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