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França: julgamento de agentes que feriram jovem negro no ânus relança debate sobre violência policial

Três policiais são julgados, a partir desta terça-feira (9), na França, por causar um ferimento no ânus de um jovem negro, em 2017, que o deixou com sequelas irreversíveis. O caso gerou comoção na França e suscitou um grande debate sobre violência policial, mas os agentes continuam na ativa. 

Theo Luhaka ficou com sequelas irreparáveis após os ferimentos causados por agentes durante uma abordagem policial em fevereiro de 2017.
Theo Luhaka ficou com sequelas irreparáveis após os ferimentos causados por agentes durante uma abordagem policial em fevereiro de 2017. AFP - GEOFFROY VAN DER HASSELT
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Os três policiais envolvidos compareceram nesta terça-feira no Tribunal de Justiça de Seine-Saint-Denis para responder sobre a detenção de Théo Luhaka, em 2017 em Aulnay-sous-Bois. O jovem negro, de 28 anos, foi gravemente ferido no ânus por um cacetete, também conhecido como bastão extensível de defesa pessoal e apresenta sequelas irreversíveis.  

O principal acusado, Marc-Antoine Castelain, 34 anos, é processado por violência intencional que resultou em “incapacidade permanente” da vítima, tendo como agravantes a sua condição de titular de autoridade pública, com porte de arma e em grupo. Ele pode ser condenado a até 15 anos de prisão.

O policial foi inicialmente indiciado por estupro, mas a acusação não foi mantida por falta de elementos suficientes durante a investigação que caracterizassem o ato.

“O golpe que dei, que originou a lesão, me ensinaram na escola, é um golpe legítimo”, justificou Castelain, no tribunal. "Estou ciente de que se trata de um ferimento grave", acrescentou o policial de 34 anos, dizendo que estava “consternado”.

Os outros dois policiais no banco dos réus, Jérémie Dulin, 42 anos, e Tony Hochart, 31 anos, também estão sendo julgados por violência intencional com circunstâncias agravantes.

O tribunal estava lotado no primeiro dia de julgamento, com muitos policiais à paisana que vieram apoiar seus colegas.

Entenda o caso

No dia 2 de fevereiro de 2017, pouco antes das 17h, um grupo de quatro agentes da Brigada de Campo Especializada, da cidade de  Aulnay-sous-Bois, na periferia de Paris, decidiu abordar um grupo de jovens do bairro popular da “cité de 3.000”. A verificação de identidade saiu do controle rapidamente e Luhaka acabou preso.

A prisão do jovem, então com 22 anos, foi captada por câmeras de segurança instaladas no bairro e as imagens foram compartilhadas nas redes sociais.

No vídeo, Luhaka é segurado por Jérémie Dulin e Marc-Antoine Castelain, que dá um golpe violento com a ponta de seu bastão extensível de defesa na zona do ânus do jovem, causando o rompimento de seu esfíncter.

Detido e levado para a delegacia de Aulnay-sous-Bois para ser colocado sob custódia policial, Luhaka teve hemorragias significativas e foi transportado pelos serviços de urgência para o hospital, onde teve que ser submetido a uma cirurgia de emergência.

O vídeo chegou até o governo francês e fez com que François Hollande, presidente na época, visitasse o jovem durante a sua permanência no hospital.

Uso desproporcional da força

A questão no julgamento será estabelecer se houve ou não uso desproporcional da força pelos policiais.

Um painel de especialistas indicou que “o gesto realizado pelo policial foi condizente com as práticas profissionais ensinadas”.

“O meu cliente realizou um gesto ensinado na academia e qualificado como legítimo por vários especialistas durante a investigação, para ajudar dois de seus colegas em dificuldade a enfrentar um jovem robusto que se rebelava e que nunca teve intenção de ferir”, comentou à AFP Thibault de Montbrial, advogado de Castelain.

Mas uma investigação da Inspeção-Geral da Polícia Nacional (IGPN) concluiu que houve “uso desproporcional da força”.

Em seu relatório, a “Polícia” estabelece ainda que “Théo Luhaka não tinha cometido nenhum atentado à integridade física dos polícias que o detinham”, quando recebeu “os dois golpes violentos com o cacetete”.

“A violência que causou tais danos, não pode ser justificada. O desafio do julgamento: dizer e julgar que os termos violência e polícia não são e nunca serão conciliáveis”, acredita o advogado de Théo, Antoine Vey.

O juiz de instrução, a investigação da IGPN e as investigações independentes do Defensor dos Direitos devem destacar que foi usado gás lacrimogêneo e que os policiais Dulin e Hochart deram joelhadas e socos quando a vítima já estava algemada no chão.

As possíveis sanções disciplinares serão pronunciadas “no final do processo judicial”, indica a sede da polícia.

A previsão é que o julgamento dure dez dias. O veredito é esperado para 19 de janeiro.

Enquanto isso, os três policiais continuam na ativa.

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