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“Eu parto do princípio de que todo corpo é político e toda dança também é política”, diz coreógrafo brasileiro em Paris

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O coreógrafo cearense Paulo Lima, da Experimentus Cia. de Dança, apresenta em Paris o solo "Dispositivo móvel". No espetáculo, ele mescla conceitos de filósofos como o francês Michel Foucault e o italiano Giorgio Agamben com o mundo da dança, mostrando que o corpo é, mais do que nunca, um instrumento político.

O coreógrafo cearense Paulo Lima apresenta dois espetáculos na França
O coreógrafo cearense Paulo Lima apresenta dois espetáculos na França RFI
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Esta é a 14ª turnê internacional da companhia cearense, da qual ele é diretor, coreógrafo e dançarino. “A dança me possibilitou fazer ponte com vários lugares, dialogar com o mundo. Esta é a primeira vez na França, mas já estivemos em vários festivais e bienais de arte contemporânea”, conta Lima.

“Dispositivo é aquilo que é do corpo da ordem, ou seja, institucionalizado. A quebra disso seria a profanação. Então eu parto destes conceitos de Agamben e Foucault para apresentar um discurso da dança, que é o ‘Dispositivo móvel’”, explica o coreógrafo.

O dispositivo, em um sentido filosófico, é um conceito criado no século XX, em meados dos anos 1970. A teoria descreve aspectos com os quais o poder atua e se reproduz.

Além disso, ele trouxe à França outra coreografia, ‘Corpo fechado para balanço’. Nela, a dançarina Léya Ramos faz um solo para mostrar questões relativas aos rituais afro-brasileiros – Léya é uma bailarina negra – e a respeito das opressões sofridas pelo corpo da mulher negra.

Ele usa trechos de músicas brasileiras que mostram como o corpo da mulher negra é utilizado como objeto. “Ele é sempre hipersexualizado, visto sempre como objeto de prazer. Então, na pesquisa para este espetáculo, com a minha parceira, escolhemos músicas como ‘Nega do cabelo duro’ e ‘Um tapinha não dói’ para mostrar esta objetificação”, explica.

Dialogo entre biopolítica e dança

A biopolítica é um neologismo usado por Michel Foucault para identificar uma forma de exercício do poder que não diz mais respeito aos territórios, mas à vida de indivíduos e seus corpos. Este conceito foi retomado e desenvolvido, entre outros, por Giorgio Agamben, que também se debruça sobre o conceito de dispositivo.

“Eu parto do princípio de que todo corpo é político e toda dança também é política. Eu tenho isso muito claro dentro do meu trabalho”, diz o coreógrafo, que procura os paradigmas políticos em experiências e fenômenos que em geral não são considerados políticos.

Segundo o próprio Foucault, “o dispositivo é um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo”.

Paulo Lima se apropria disso para, segundo ele, “escancarar a potência do corpo”.

“Dentro do trabalho nós procuramos escancarar, abrir a potência deste corpo criativo como ele se apresenta: trazendo as nossas opressões do dia a dia, e essa profanação é a possibilidade de potencializar cada vez mais, sem tabu nem censura prévia”, diz o coreógrafo que começou a carreira na dança e só depois foi estudar Filosofia.

“A filosofia me deu a possibilidade de eu compreender melhor o mundo, as coisas que me cercam, e situou a minha dança. Eu costumo dizer que colocou a minha dança em outro lugar. Dança e filosofia estão imbrincadas”, conta ele, que se dividia entre ensaios e aulas de Filosofia.

Sobre sua carreira internacional, Lima gosta de lembrar que, sem incentivo do governo, entre outros, ela não seria possível. “É importante dizer que o governo do Estado do Ceará investiu neste potencial; é bom dizer isso porque no Brasil a gente está vivendo uma escassez completa de recursos, de apoio. Acabou o Ministério da Cultura, então nós estamos sofrendo com isso, sofrendo com perseguições...”, diz ele.

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