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Após cinco anos de repressão, "não resta nada da democracia da Nicarágua", diz especialista

A Nicarágua celebra cinco anos do movimento de estudantes contra o governo do presidente Daniel Ortega, que deu origem a uma violenta repressão, deixando mais de 350 mortos, centenas de pessoas presas e outras 100.000 exiladas. Grupos de direitos humanos, a ONU e governos ocidentais acusam o regime nicaraguense de tentar erradicar qualquer oposição.

Uma foto do presidente Daniel Ortega e da vice-presidente e sua esposa, Rosario Murillo, em Manágua, ma Nicarágua, em 27 de março de 2020 (image de ilustração).
Uma foto do presidente Daniel Ortega e da vice-presidente e sua esposa, Rosario Murillo, em Manágua, ma Nicarágua, em 27 de março de 2020 (image de ilustração). REUTERS - Oswaldo Rivas
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Em 18 de abril de 2018, estudantes nicaraguenses lançaram um amplo movimento de protesto contra um projeto de redução do valor das aposentadorias e contra o governo. As manifestações foram duramente reprimidas pelo regime do ex-guerrilheiro Daniel Ortega. Pelo menos 355 pessoas morreram, segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Todos os opositores estão presos e mais de 200 foram expulsos do país em fevereiro deste ano e tiveram sua nacionalidade retirada.

Cinco anos depois, o que resta da democracia nicaraguense e da oposição? "Nada mais, na medida em que, por um lado, o poder foi literalmente bloqueado pelo casal Ortega - Daniel Ortega e sua esposa Rosário Murillo - todos os poderes estão hoje nas botas do casal presidencial", analisa Kevin Parthenay, professor de ciência política pela Universidade de Tours e especialista em América Central, em entrevista à RFI.

"Literalmente nada resta da oposição, na medida em que qualquer oponente é preso e colocado na prisão, ou, como vimos, é libertado, não está mais na prisão, mas é forçado ao exílio, tem sua nacionalidade retirada. O que estamos vendo hoje, mais uma vez no país, são mudanças radicais, principalmente em relação à Igreja Católica no país, que sempre teve uma influência fortíssima", diz o especialista. 

Até mesmo as procissões religiosas de Páscoa foram proibidas. “Para o regime, isso representa um risco”, comenta Parthenay. "Na realidade, para o regime, tudo hoje representa um risco. E as procissões são consideradas potencialmente perigosas, pois se trata de uma ocupação do espaço público que pode levar a críticas ao governo ou acabar por ter uma repercussão política", diz.

Deterioração da democracia

A Anistia Internacional aproveito o triste aniversário para publicar o relatório "Um grito de justiça: 5 anos de opressão e resistência na Nicarágua", um documento que apresenta uma visão geral da crise dos direitos humanos no país. 

O estudo expõe as principais estratégias do governo de Daniel Ortega para "fechar o espaço público e reduzir ao silêncio os defensores dos direitos humanos, os militantes, jornalistas e todas as vozes dissidentes que criticam o governo", como detenções arbitrárias, tortura, desaparecimentos forçados, execuções extrajudiciais e privações arbitrárias de nacionalidade. 

A organização também relata a perseguição e a repressão exercidas contra as organizações de defesa dos direitos humanos e os veículos de comunicação independentes. 

No início de abril, o Conselho de Direitos Humanos da ONU disse que estava “muito preocupado com a deterioração da democracia, do estado de direito, da separação de poderes e da situação dos direitos humanos na Nicarágua”, e votou para estender e fortalecer uma missão de investigação no país. 

Excepcionalmente, o Conselho decidiu renovar o mandato da missão de averiguação por dois anos, em vez dos habituais doze meses, e reforçar o seu roteiro. O objetivo era principalmente de examinar a decisão do governo de privar centenas de opositores de nacionalidade. A decisão da ONU foi elogiada por organizações de direitos humanos.

Mais repressão

Juán Sebastián Chamorro é líder da oposição e da Alianza Cívica pela Justiça e a Democracia na Nicarágua, um grupo de organizações e cidadãos que iniciaram um processo de diálogo com o governo de Ortega, no qual a Conferência Episcopal da Nicarágua é mediadora.

Exilado nos Estados Unidos, o sobrinho da ex-presidente Violeta Chamorro foi preso quando era candidato à eleição presidencial em 2021. Entrevistado pela RFI, ele diz que a repressão se intensificou com a aproximação do aniversário da revolta de 2018. 

O líder da oposição nicaraguense Juan Sebastián Chamorro, após chegar da Nicaragua no Aeroporto Internacional de Washington-Dulles, em 9 de fevereiro de 2023.
O líder da oposição nicaraguense Juan Sebastián Chamorro, após chegar da Nicaragua no Aeroporto Internacional de Washington-Dulles, em 9 de fevereiro de 2023. AP - Jose Luis Magana

"Houve mais de 55 prisões por motivos políticos durante a semana de Páscoa. As prisões estão cheias de novo e teremos novas detenções nos próximos dias porque a ditadura quer que o medo reine. É impossível manifestar neste momento", diz. 

Mas segundo ele, os cinco anos que passaram mostraram a importância de continuar unidos na luta contra "esta ditadura brutal que viola todos os direitos humanos e políticos que podem existir na legislação nacional e mundial". 

"Mas no fim das contas, esta ditadura não é diferente das outras que a precederam e vai acabar caindo", diz otimista Chamorro.

O governo da Nicarágua, através de seu Parlamento, aprovou uma iniciativa de lei que declara 19 de abril como Dia Nacional da Paz, enquanto os opositores chamam a data de Dia Nacional em Memória pelas Vítimas da repressão. 

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